quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Sobre mercúrio e conexões

Aos vinte anos eu já falava com parceiros e namorados sobre essa "conexão verdadeira" que eu sonhava tanto ter com o outro. Uma ligação genuína, realmente entregue, que fizesse sentido, que fizesse tudo valer a pena. Uma ligação profunda, sem medos e sem amarras. E me lembro de alguns deles me perguntando: mas o que é afinal essa "conexão" que você espera ter com alguém? Eles não sabiam. Talvez não se importassem. Talvez nunca tivessem pensado a respeito. Mas para mim aquilo tinha que valer. Tinha que ser entrega de verdade. Uma ligação qualquer que não se desfizesse por completo daí a dois meses. Daí a duas semanas. Mas a gente cresce, amadurece, e começa a ver as coisas com mais clareza. E entende que a gente é absolutamente prescindível. Desgraçadamente prescindível. Toda vez que você acredita na possibilidade dessa conexão, toda vez que você começa a acreditar, ela se desfaz no ar, escorrega por entre os seus dedos. Como quando você era pequeno, adoecia e sua mãe vinha medir a sua febre com aquele termômetro de mercúrio, e você levantava para ir ao banheiro, se descuidava e deixava o termômetro cair dentro da pia e quebrar, e aquela coisa prateada serpenteava e descia pelo ralo com tanta rapidez que você ficava perplexo por um ou dois minutos, procurando entender como aquilo tinha acontecido. E como tinha acontecido tão rápido. Você não sabia se lamentava ou se ficava surpreso, ou se preparava uma desculpa para explicar o desastre. A maior parte dos relacionamentos, especialmente os de hoje, fatalmente os de amanhã, é como o mercúrio. Apenas lampejos. Vislumbres do que poderia ter sido. E nunca foi.

Você não é imprescindível. Você não é especial. E você enfim entende que as pessoas sempre estiveram, estão e estarão cada vez mais preocupadas em estabelecer laços, sim: consigo mesmas. A ter responsabilidades dentro de um relacionamento. Consigo mesmas. A se abrirem de verdade. Para dentro de si mesmas. E a se fecharem lamentavelmente para o outro, para o mundo do outro. Para a descoberta do outro. Para as tentativas algo persistentes. Para a possibilidade dos erros, mas também dos acertos. Os relacionamentos de hoje, perdoem a amargura de alguém que jamais teve sorte, existem, sim, em um grau bastante profundo. Com nossos celulares. Com o notebook, o tablet, o ipad, o Mac. Que a conexão esteja rápida. Que eu consiga postar a minha foto do pôr do sol antes que ele se ponha. Que a pessoa do lado não atrapalhe a foto. Que a conversa seja breve, e que quase nada signifique. Que os sorrisos e os olhos nos olhos sejam escassos, porque, olha só, eu não tenho muito tempo. "E o amor, o que é?" "Filha, essa você vai ter que pesquisar no google, porque a mamãe já se esqueceu." "E conexão, mamãe?" "Conexão? Essa a mamãe sabe. Isso é o que eu pago caro todo mês que é pra você poder usar o google e parar de me fazer tanta pergunta." É verdade. Eu deveria ter adivinhado aos vinte anos. Conexão acabaria por ser tudo o que não iria me faltar. Mas só se não faltar luz. E se as contas estiverem pagas.

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