quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Resenha: The Juliette Society

Resenha: The Juliette Society, de Sasha Grey
5 de agosto de 2015

Eu sempre pego um livro para ler, verdadeiramente, aberta às ideias do autor, ao estilo dele, ao que ele pode me trazer de bom através daquela leitura. Procuro sempre, sempre, deixar o preconceito de lado. Mas o fato é que em tudo existe um certo limite. Não dá para ser completamente permeável em relação a tudo, a qualquer estímulo. E num primeiro momento não consegui fazer isso em relação ao livro de estreia de Sasha Grey, famosa ex atriz pornô. E que agora também se define como diretora, cineasta, fotógrafa, musicista e artista performática. Pergunto-me, por vezes, existe algo que Sasha Grey não faça? 

The juliette Society e Sociedade Secreta do Sexo, do brasileiro Marcos Nogueira, vieram na esteira de 50 Shades of Grey. Sasha chega mesmo a citar A Ordem Secreta dos Libertinos, mencionada e pesquisada por Marcos Nogueira em A Sociedade Secreta do Sexo.

Uma das coisas que me incomodaram a princípio foi a necessidade de Sasha de se mostrar culta e cinéfila, se é que ela o é de fato, aliada a uma vontade bastante compreensível de empregar algum tipo de credibilidade ao seu livro de estreia. Me incomodaram a princípio as menções e referências excessivas e aparentemente despropositadas a filmes e a diretores consagrados, e mesmo a famosos artistas visuais como Marcel Duchamp. Cita Godard omo quem, perdoem o trocadilho, goza de certa propriedade, e chega a mencionar Cidadão Kane, de Orson Welles, para mim, intocável. Sasha ainda se propõe a analisar o filme e seu final, como uma perfeita crítica de cinema, com aquela palavra "Rosebud" dita daquela forma, e procura dar um outro significado a ela. E eu jurava que não conseguia ver de forma alguma a conexão de todas as referências cinematográficas dela com a história que ela quer nos contar. Não conseguia perceber o link. Até compreender, a certa altura do livro, que sua personagem principal era uma estudante de cinema. Ainda assim, achei todas aquelas referências bastante excessivas.

A certo ponto eu, que pensava que não me surpreenderia com mais nada relativo a práticas sexuais a essa altura da vida, senti um asco semelhante ao que tive quando assisti uma certa cena de O Último Tango em Paris, ou quando li alguns trechos de A História do Olho, de Georges Bataille, ou do sofrimento da Menina Má nas mãos de seu amante japonês em Travessuras da Menina Má, de Mario Vargas Llosa, no momento em que Sasha me revela a existência do "drilldo". Se você também até agora não sabia o que era isso, faça uma pesquisa de imagens no google e entenda o porquê do meu asco e da minha revolta. Anos e anos de dedicação de grande parte das mulheres ao feminismo, à igualdade de direitos e de respeito entre os sexos, e de repente me deparo com aquele aparelho de tortura moderno, que se encaixaria de maneira muito mais apropriada na Idade Média. Existe uma sexualização e uma objetificação excessivas da mulher, e somente da mulher, na história que Sasha Grey nos conta. E em vez de valer-se da fama, da notoriedade e da influência que tem para criar uma obra qualquer que não ostentasse a misoginia, e colocasse certos valores feministas no devido lugar, ela faz justamente o contrário. Exalta essa objetificação feminina. Ela provavelmente não está interessada no lado intelectual, político e prático dessa brincadeira toda. Se é que ela sabe que existe algum.

Por vezes ela me vem com trechos absolutamente insólitos do tipo:

"Que desperdício de energia preciosa. Se ao menos alguém inventasse uma maneira de estocar essa energia na fonte. Ou encontrasse uma maneira de transformar em combustível os bilhões de Kleenex rígidos de porra descartados diariamente. Se alguém descobrisse como fazer isso, a maioria dos problemas de energia do mundo seria resolvida em um piscar de olhos. Acabariam as guerras pelo petróleo. Não haveria mais pegadas de carbono. Nada de resíduos nucleares. Nem mais um centavo da arrecadação de impostos gasto em pesquisas de fusão a frio."

Continuo até agora sem saber se acho graça do referido trecho ou se só fico mesmo com pena da mentalidade excessivamente fértil de Sasha.

Sua tentativa de transformar o professor Marcus numa espécie de Norman Bates da literatura também não foi bem sucedida. Achei a ideia claramente pretensiosa, e a tentativa, fraca e ineficaz.

Não consegui me excitar realmente lendo essa primeira história de Sasha Grey. Acho que ela erra um pouco a mão na medida do que é explícito, enquanto eu prefiro histórias um pouco mais sutis, que deixem a imaginação respirar e trabalhar um pouco também.

No entanto não dou uma estrela, mas duas. E o fato não é por caridade. Em muitos momentos a história contada por Sasha consegue realmente entreter e fazer você se perguntar o que virá a seguir. Seu primeiro livro tem lá o seu mérito. Existem alguns personagens interessantes e com potencial, tipo Kubrick e Bundy. A história flui, perde um pouco o ritmo lá pelo meio e então se recupera com a chegada de um novo personagem e o fator suspense como bônus. A leitura é fácil, extremamente acessível e simples, como imagino que devem ser os potenciais leitores de Sasha.

Os elementos estão todos lá: alguns personagens interessantes e relativamente bem trabalhados, dinheiro, poder, sexo, suspense, mistério, aventura, romance (extremamente morno entre Jack e a protagonista). A fórmula básica dos best sellers está ali. De maneira que, com um pouco mais de prática, dedicação, talento e investimento financeiro, por que não, Sasha pode acabar um dia chegando lá.

E, claro, como aspirante a cinéfila que sou, não me furtei a anotar títulos de filmes e alguns diretores por mim ainda desconhecidos para conferir depois. ;-)

Nenhum comentário:

Postar um comentário